Hyoga e o Édipo – quando é preciso deixar a mãe para trás





Para quem foi criança nas duas décadas anteriores, é impossível falar de Cavaleiros do Zodíaco sem sentir um sentimento de nostalgia, afinal, foi ele quem abriu as portas para a onda de animes que tomou o Brasil. Se perguntar para seus fãs qual foi a saga mais marcante, nove entre dez, irão afirmar que foi a saga das doze casas, e é sobre um dos eventos mais importantes dela, que iremos falar...



Sobre as doze casas

Nessa saga, a deusa Athena (protagonista) foi atingida por uma flecha em seu peito e em doze horas essa flecha perfuraria seu coração, O único que poderia tirá-la era o mestre do Santuário (que se tornou maligno). Para chegar até sua sala, os cavaleiros de bronze tinham que atravessar as doze casas do zodíaco, sendo cada uma delas defendida pelos mais poderosos de todos, “Os cavaleiros de ouro.”




            Essa saga, guardada no coração de muitas crianças (hoje adultos), teve inúmeras batalhas marcantes, mas poucos encontros têm tanta carga dramática quanto o de Hyoga, o Cavaleiro de Bronze de Cisne e seu Mestre Camus, o Cavaleiro de ouro de Aquário. Um confronto repleto de simbolismos.

            O fantasma da mãe

Hyoga perdeu sua mãe quando ainda era criança, porém, todos os dias, depois que se tornou cavaleiro, ele nadava até o barco afundado onde seu corpo estava, levando rosas, pois, apesar de falecida, sua mãe sempre foi o centro de sua vida. Hyoga se tornou cavaleiro e lutou pela armadura de ouro no começo do anime como uma homenagem a sua mãe, demonstrando claramente isso.



Na saga das doze casas, Hyoga encontra seu mestre (manga) ou mestre do seu mestre (anime), Camus de Aquário, na casa de Libra. O Cavaleiro de ouro diz para Hyoga que ele era extremamente sentimental e que se não abandonasse essa devoção a sua mãe, ele nunca alcançaria o sétimo sentido e logo seria derrotado por outro cavaleiro na batalha.


“PS: Sobre o sétimo sentido, ele é o poder máximo de um cavaleiro, poder esse que todos os de ouro já possuem plenamente desenvolvido. A única forma dos de bronze vencer, seria alcançá-lo e assim igualarem as forças.”



            Camus diz para seu pupilo que a única chance de alcançar o poder máximo seria superar a perda da mãe e das correntes que o prendem em relação a ela. Vendo Hyoga incapaz de fazer isso, Camus com uma rajada afunda ainda mais o barco onde está a mãe de cisne, fazendo - o se perder no vazio do mar Ártico.

            Ao final do embate, Hyoga chora desesperadamente, e diz que nunca conseguiria abandonar sua mãe, não tendo outra escolha, Camus derrota seu pupilo (antes que outro o fizesse) e como forma de homenagem, o congela em um esquife de gelo, mantendo seu corpo eternamente na casa de Libra.


            Hyoga, Camus e o Édipo


            O Édipo em sua forma positiva e mais famosa, tem como principal base o fato do menino ter como primeiro amor, por consequência da proximidade e de todos os cuidados,  a sua mãe. Na fase edípica, ao mesmo tempo em que, o menino a ama e quer ela só para ele, ele tem como rival o pai, tendo um sentimento misto de ódio e amor por este. Porém, é o pai ou a (figura paterna) que separa a mãe do menino, que na fantasia do garoto, o ameaça de perder a parte mais importante de si, caso insista nesse amor, algo que leva ao que Freud chamou de Complexo de Castração.

            Tanto no anime quanto no mangá, não fica clara a relação de Hyoga e seu pai. Toda história gira em torno sempre dele e sua mãe. A sua mãe era seu grande amor, aquela que o inspirava e para quem dedicava todas as suas conquistas como cavaleiro.



Nesse embate, Camus entra como o pai que Hyoga não teve. O Cavaleiro de Ouro deixa claro para o jovem a escolha que ele teria que fazer: Ou se libertar da total devoção por sua mãe (sentido de entender que ela não é o centro de sua vida) e assim alcançar o sétimo sentido (desenvolver – se totalmente enquanto homem, crescer), ou ser derrotado pelos cavaleiros de ouro, que no caso, simbolizariam a vida.  Em outras palavras, assim como no Édipo, Camus propõe, ou a sua mãe como objeto principal de seu amor ou a sua vida enquanto cavaleiro (seria o seu falo).



Hyoga afirma que é incapaz de fazer o que Camus propõe e é congelado em um esquife de gelo, que de forma muito simbólica, pode representar o fato dele, enquanto homem, ter ficado congelado em um momento de sua vida, de seu desenvolvimento do qual não consegue sair. O gelo de Camus é, aparentemente, indestrutível, ou seja, Hyoga fica protegido dos problemas do mundo, mas incapaz de andar e viver a vida plenamente.



Importante dizer que mais a frente na saga, Hyoga é libertado do esquife de gelo e novamente luta contra o seu mestre. Sobre esse embate, Hyoga finalmente supera seus medos e deixa os fantasmas para trás, estando livre para enfrentar Camus e a vida de igual para igual e de maneira plena.

Renan Souza de Oliveira CRP 06/151946
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Referências bibliográficas

NASIO, J.-D. Édipo: o complexo do qual nenhuma criança escapa. Zahar, 2007.

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